terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Entrevista com Davi B. Vieira


Nome: Davi Bezerra Vieira
Atual Função na CIA Íkarus: Diretor
Entrevistador: Jonas Fortuni


1. Quando surgiu o interesse por teatro na sua vida?
Aos 14 anos. Quando colegas de sala decidiram montar uma peça.


- E essa peça resultou em alguma coisa? Talvez alguma que reflita até hoje na sua vida?
Sim. Montamos um espetáculo. Raso, capenga, fraco. Daí aprendi que queria aperfeiçoar. Precisava. Que não bastava querer fazer. Precisava embasamento e muito mais esforço.


2. O quão você diria que a arte é importante em sua vida?
Tão quanto respirar.


3. E sobre a arte em Jaguaribe? O que você acha dela em geral e especificamente do teatro?
Somos sobreviventes (risos). E entusiastas. Apesar do pouco apoio temos conseguido galgar bons resultados.


- Poderia distinguir um pouco a arte em geral e especificamente o teatro dentro de Jaguaribe?
Arte em geral, se refere a toda manifestação desde folclórica até mesmo contemporânea que exprima algum tipo de sentimento. O teatro por sua vez, é uma dessas facetas da arte. Considero arte, desde a gastronomia, as histórias, os rituais religiosos e por aí vai. Mas, o teatro por sua vez pode se apropriar de todas essas artes e transfigurá-las num universo imagético. Numa gama de possibilidades estéticas. Pelo menos, é o que tentamos buscar enquanto CIA.


- Mas como você compararia o teatro às outras artes no município?
Não comparo. São partes diferentes de um contexto maior. A arte é tão difícil de explicar quanto o conceito de vida. Cabe muita coisa, é diversa. O que vejo neste caso, em nossa cidade, é que a arte do teatro costuma ficar em terceiro plano. Ou nos últimos. Deixando a desejar. Como ser mais claro? No nosso caso, as principais e mais endeusadas manifestações são o queijo e a renda de filet. Mas, onde fica o resto? E as outras manifestações? e o cordel? E os cantadores? E as histórias e a própria história da cidade?


4. Por que "Íkarus"?
Bom, Ícaro ficou famoso pela história de sua morte por motivo nada comum, ao cair no Egeu quando a cera que segurava suas asas artificiais derreteu. Ícaro era filho de Dédalo, um dos homens mais criativos e habilidosos de Atenas. O que se percebe nas entrelinhas é seu desejo por liberdade. E seu ímpeto por voar. Seu deslumbramento pelo sol. Penso em “Íkarus” pela nossa vontade de voar, de arriscar-se e quando cair, erguer-se e ser novamente um Ícaro, sonhador, voador. Destemido. Herdeiros de criatividade e habilidades mil.


5. Em quase 12 anos de CIA Íkarus, qual a maior conquista que o grupo já alcançou na sua opinião?
Pessoas que amam o teatro tanto quanto eu. Pessoas como você! Nossa maior conquista!


6. Devido à idade juvenil da maioria dos membros, o rodízio de elenco acontece bastante na CIA. Como lidar com isso?
Com maturidade e respeito. Dói, mas oxigena o grupo. Gente nova, ideias novas, nos faz estar sempre se renovando também. Tira o grupo da Zona de conforto. O conflito faz o espetáculo (risos).


7. O que você busca num ator?
Um ser humano aberto a aprender. Simples assim.


8. Como funciona a política dentro da CIA? Democracia? Burocracia?...
‘Loucucracia’. Somos democráticos na medida, mas prefiro a meritocracia.


9. Tendo em vista novamente que há um grande número de adolescentes no grupo, como se dá a relação entre a CIA e as famílias dos membros?
Numa tentativa constante de puxar para perto. A família tem que ser parceira. Buscamos isso. Para ajudar no crescimento do ator enquanto cidadão e enquanto artista.


10. Que conselho você daria para uma pessoa que está pensando em entrar para a CIA Íkarus e, consequentemente, adentrar ao mundo do teatro?
Pense de novo. Aqui não é apenas lazer. É trabalho árduo. Amor e resultados.


11. Agora puxando o foco um pouco para o espetáculo Altera - o outro lado… primeiramente, de onde surgiu ideia para aquilo?
De um desejo: Sempre gostei de viajar nas obscuridades, os medos, no imaginário. Gosto da abertura que este tipo de espetáculo permite e como ele toca nas pessoas. Como ele me toca.


12. Se você tivesse que remontar todo o Altera de novo, mas dessa vez tivesse que mudar todas as cenas completamente, há algo que você não seria capaz de modificar? Uma cena? Um ato? Um personagem?
Se remontar e mudar todas as cenas, seria ainda o altera?! Penso que não. Cada cena tem sua densidade, sua razão de ser e encorpa os personagens. Prefiro não mudar. Aperfeiçoar, talvez. Mudar completamente tiraria o sentido.


- Mas você por acaso teria um personagem pelo qual sente mais carinho? Uma cena favorita? E por quê?
Gosto do Lamentation [cena em que uma criatura parece tentar libertar-se da própria pele]. Por quê? Não sei. Simplesmente mexe comigo.


13. Quanto você me diria que o Altera é a mais do que o público consegue ver?
Os leigos veem 10 %. Os atores, 50%. Eu, 80%. Os loucos certamente verão os 100%.


14. Muitas pessoas questionam o porquê de permanecer com o mesmo espetáculo por anos e acredito que isso é uma dúvida constante que chega aos seus ouvidos. O que você diz para essas pessoas?
Cada espetáculo tem sua forma e força. Não pode-se criar algo grande e deixar morrer. Por exemplo, A Monalisa, de Da Vinci, permanece intocável, rara, única. O Altera evoca lados e mexe com o público de forma especial. Quanto a criar algo novo, esse desejo é permanente, mas carece/depende de muitos fatores, inclusive o humano.


15. A CIA Íkarus também tem espetáculos fora de cartaz, correto? Poderia falar um pouco sobre eles e se há alguma chance de algum ser a próxima (ou uma das) estreia da companhia?
Todos estão disponíveis, se a cia abraçar a ideia eu abraço junto. Desejo que sim, mas depende dos atores, em especial, da dedicação extrema deles.


16. Agora voltando o foco para o Morpheus - conte-me seus sonhos, por que sonhos?
Por que não? O teatro nos permite ‘romanciar’ o sonho que é a máxima de Morpheus. O Morpheus me traz algo de mágico, belo, emocional, nostálgico.


17. Cite-me uma lição que você costuma reforçar muito com seu elenco.
O palco...
- É sagrado. Sim, lembro bem (risos).
Penso caber tudo aí nessa frase. Todo respeito e amor que precisa ter por nosso espaço de criação, ação, contemplação.


18. Agora fazendo a mesma pergunta que fiz sobre o Altera, Há algum personagem ou alguma cena que te cative mais do que qualquer outro(a) no espetáculo Morpheus?
A mãe e o balanço, sempre.


19. A Mírian Narrara [atualmente membro do elenco da CIA Íkarus] mandou-te uma pergunta: Se você tivesse que escolher entre ganhar a vida como artista ou como Biólogo (sua formação) qual escolheria?
Um biólogo artista, ou um artista biólogo.


20. A Mírian Narrara ainda mandou-te outra pergunta: Você sempre teve seus colegas de arte como amigos mesmo sendo o diretor. Você tem medo de que algum dia essa amizade possa se perder e eles possam não te respeitar mais como antes?
Já ouviu falar do conto do gato e a onça? Ensine tudo que as pessoas precisam aprender, e não tudo que sabe (risos). Guardo o pulo do gato só pra mim. Quanto ao respeito, creio que essa construção é bem firme. Somos um grupo e isso nos fortalece. Se alguém perder esse respeito, não será por mim, será pelo grupo, e portanto não será mais visto como parte dele.


21. O Douglas Lima [atual membro da equipe técnica e da diretoria da CIA Íkarus] mandou-te uma pergunta também. Inclusive, ele ressaltou que deveria ser uma pergunta sempre feita a todos os membros da companhia: Você está disposto a tratar a companhia como uma responsabilidade? Se sim, mais importante que eventos de lazer rotineiros?
Se fosse apenas lazer, não teria tantas conquistas e boas histórias para contar (risos). E desejo muito que aqueles que ainda veem como lazer, repensem no significado de nossa CIA. Não é apenas lazer, é quase um sacerdócio (risos).


22. O João Pedro [atualmente, o membro mais recente do elenco da CIA Íkarus] também mandou-te uma pergunta: Como é ser um Diretor de uma companhia?
Intenso. Muito. Muitas responsabilidades. Mas, gratificante também.


23. Que relação a CIA Íkarus tem com a Prefeitura de Jaguaribe?
Parceira. Um tanto rasa ainda, mas atendendo o mínimo.


24. Que dica você daria para um grupo novo que estivesse começando no seu município?
Lute. Persevere. Esqueça de poder público, fortaleça-se enquanto grupo, depois passe a reivindicar os direitos cabíveis. Mostre trabalho e depois cobre retorno.


25. Qual você crê que é a maior dificuldade da CIA Íkarus atualmente?
Compromisso da maioria. Comodismo. Inclusive dos veteranos.


26. Onde você deseja ver a CIA Íkarus no futuro, talvez daqui há uns 10 anos?
No mundo inteiro. 


27. Davi, se você pudesse voltar no tempo, voltaria? E, caso sim, para quê?
Não voltaria… Espera, voltaria sim. Para abraçar um amigo que se foi. Dizer que o amava muito.


28. Se estivesse prestes a perder o dom de enxergar, qual gostaria que fosse sua última visão?
O rosto daqueles que amo.


29. O que mais admira e o que mais repudia nas pessoas?
Admiro a verdade, e fidelidade no que acredita. Odeio cinismo.


30. As próximas audições da CIA Íkarus se aproximam. Algo a declarar? Ansiedade? Dicas?
Façam o melhor. Só digo isso.


31. O que é o mundo com arte e o que é o mundo sem arte?
Existe mundo sem arte? Seria cinza e triste.


32. Davi Vieira por Davi Vieira?
Bom, sou uma pessoa que sonha muito. Costumo me distrair com coisas simples, e ao mesmo tempo mergulhar fundo em ideias ao ponto de parecer noutro mundo (E sentir-me nele). Gosto da Natureza. De conversar sobre assuntos complexos como teorias quânticas e ao mesmo tempo gosto de conversar trivialidades, como se chove ou não. Quando amo, sou sincero. E àqueles que escolho como amigos, levo-os pra sempre. Amo, cuido e protejo. Sou feliz. Por vezes, melancólico. Sinto saudades, vontade de abraçar quem está longe. Busco sempre demonstrar meu afeto, pois é parte de minha personalidade. Amo sem ressalvas. Acredito em discos voadores e discos de vinil, curto a vida ao meu modo. As vezes quero ficar em casa. As vezes longe ainda é perto. Sou desbravador. Tímido. Medroso. Humano demais. Gosto de ajudar. Sou teimoso, mas flexível, por vezes. Sou simples assim, em gênero, número e grau.

Publicado por: Jonas.

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